Thursday 2 April 2009

O problema da escolha

(texto de: O Coxo)

Vieram-me com a proscrição veloz das ideias inacabadas.

Perante isto calei-me. Não porque não tivesse algo a dizer, mas porque há silêncios onde a palavra não tem lugar. Onde a retórica inspira um certo assombro.

É uma perversão da ininteligibilidade.

O problema era este: os jogos do amor beatificado corrompiam o discurso. Exaltava-se a reverência conformista a uma fé inacabada e rebaixavam-se as virtudes de um movimento perspicaz no sentido da acção.

(compreendamos a acção como a desenvoltura do fogo: a flecha erótica das labaredas exacerbando as sombras)

E depois vem alguém e diz:

- No pavor do silêncio a melhor arma é a morte !

E começamos a compreender: a perspectiva da morte é a explosão libertadora que está na origem de uma motricidade inclinada para a acção. A urgência da morte reclama a vida de forma ainda mais urgente.

E Sartre a seguir acrescenta:

- A vida é absurda.

Eis-nos tombados no plano da urgência da absurdidade, a não subjugação da vontade a uma aleatoriedade opressiva: a escolha. A escolha passa a fazer-se na aceitação do absurdo, sem condicionamentos religiosos ou sociais: a verdadeira confirmação do ser !

Há ainda o problema da vontade. A vontade está putrefacta ! Todo o ser é um ser adiado enquanto se submeter aos caprichos do olhar. Enquanto se deixar inebriar pela ansiedade que constroi casa no medo mesquinho, no costume e na usura.

A escolha é um imperativo da solidão. Nela assume um caracter vísceral, demonstrando-se na intenção do corpo. O corpo, como elemento adverso à virtude, serve como veículo desmistificador da morte, como matéria primordial duma filosofia pagã que se diz livre de canibalismos.

No entanto vivemos dilacerados por este amor rebarbativo que nos devora vivos. Este amor antropófago.

Enfim, tudo isto se resume em duas ou três palavras que me recuso a dizer.

O importante é tê-lo dito.

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