Monday, 29 September 2008

Na berma da estrada

texto de: O Coxo

Amanhã é improvável. A não ser que passe alguém e me leve. Se passar alguém que me leve então deixarei de ser louco. Abdicarei de anos e anos de desconstrução interior.

Na berma da estrada, ou mesmo parado sobre um passeio de granito, um louco transborda-se. Sobra-se (é por isso que um louco ocupa sempre dois lugares num banco de jardim).

E no entanto os loucos são absurdamente magros.

Por outro lado há por aí pessoas muito pequenas. Gente que sabe fazer malas e consegue fechá-las no fim, sabes ? Comigo nunca resulta: há sempre uma manga de camisa de fora ou uma meia que teima em cair.

Por isso amanhã é improvável. A não ser que passe alguém e me leve. Se passar alguém que me leve então fecho a luz e acordo (porque eu sonho excessivamente de luz aberta). É que num louco há um relógio imperativo que não não toca. Ainda é manhã quando um louco anoitece e mesmo assim julga-se madrugador.

Por isso o improvável. A não ser que passes por aqui e me acordes e me leves contigo e me penteies em frente ao espelho para me dares a dignidade de que os loucos carecem e depois quem sabe se na berma da estrada possamos, sei lá, apanhar uma boleia e partir à procura dessa gente miudinha que sabe fazer a mala e que anda sempre de risca ao meio ou podemos ficar por aqui de luz fechada deitados lado a lado sobre o chão de granito a ver as estrelas cair até que um tipo de bata branca me agarre e me ponha a camisa de forças, e aí sim, é provável que eu vá.

Tuesday, 23 September 2008

AMR jam sessions









AMR Jazz Jam sessions are back !

That is my favorite spot for Geneva's tuesday evenings from 21h30.
See you in rue des Alpes one of these tuesdays...

Sunday, 7 September 2008

There's an elephan in the room













(click to enlarge)

work from Banksy

Banksy in New Orleans


New Orleans
"Apparently there was some kind of storm here, a few years ago"
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Wednesday, 3 September 2008

porque amanhã vai chover

texto de: O Coxo

Chovia póstumamente. As gotas fustigavam as janelas com um amor exacerbado. Penetravam pacientemente nos interstícios da fé.

(porque a água procura o homem na inviolabilidade das casas)

Dentro das casas os homens rezavam. Todos os homens transbordam de fé nos dias chuvosos. Recusam o afecto dos elementos por detrás de janelas de vidro duplo.

E as gotas batiam, soletradas. Gotas ígneas, quimicamente compostas. Esse fluido devoto era o motor da fé restablecida. Uma fé alcalina.

Quando a chuva parou os homens choraram. Tinham-se habituado ao ruído da chuva lá fora e a esse medo pueril que alimenta o divino. Alguns suicidaram-se. Outros voltaram a acreditar na necrologia e nos posfácios. Escreveram autobiografias, prepararam sepulcros, compraram gerânios.

Houve ainda aqueles que ficaram simplesmente junto à janela, imóveis. A fé suspensa na espera.

É que Deus nunca existe em dias de sol.