texto de: O Coxo
Inácio não tinha relógio, por isso deixou crescer a barba. Havia entre os seus colegas de trabalho quem duvidasse que uma barba pudesse substituir um relógio. Os funcionários são criaturas avessas às pilosidades preferindo uma boa dose de cepticismo e um relógio de quartzo. Mas Inácio não se intimidou. E a dita cuja foi crescendo desavergonhadamente ao ritmo de um centímetro e meio por dia útil.
Era uma barba monstruosa. Possuia uma dinâmica vida interior que se desenvolvia no sentido dos infinitos espaços inter ministeriais. Movia-se com destreza nesse jogo de minúcias temporais, animada de secretas intenções.
Perante o assombro geral, a barba ganhava terreno na repartição. Já tinha chegado ao armário das circulares administrativas e dos procedimentos anexos e ameaçava agora sem qualquer pudor a mesa dos formulários urgentes e dos requerimentos por intermédio de terceiros.
Esta prodigalidade começava a preocupar o Sr. Bonifácio que se ocupava das licenças e alvarás e que tinha visto desaparecer, sob a barba de Inácio, dois dossiers carregadinhos de processos em apreciação.
Várias barbearias, dois cabeleireiros unisexo e uma loja de tesouras ficariam assim irremediavelmente arruinados.
Coincidência ? não para o Sr. Bonifácio, que mantinha a barba debaixo de olho durante o horário legal de trabalho. Sem embargo, fazia cinco minutos de pausa para café de manhã e dez minutos à tarde, onde aproveitava para ler o jornal do ministério, inteirando-se assim dos pormenores mais escabrosos que animavam a vida da direcção geral de assuntos internos.
Um dia os acontecimentos tomaram um rumo inesperado. Bonifácio reparou que a barba crescia assincronamente em horas de ponta. A situação era inaceitável. Os funcionários inquietavam-se e corriam em todas as direcções. Adiantavam relógios na esperança de conter essa força desmedida.
Tinham convicções. Sabiam os horários de cor, com as suas tabelas e anexos. Confiavam na usura. Alicerçavam a sua vida no hábito lentamente acumulado. E agora a barba.
Inácio não se comovia. Vivia no alheamento das sombras.
Na sua loucura preenchia impressos.
As hierarquias rapidamente decretaram a nova situação como perfeitamente enquadrada pelas regras em vigor, o que tranquilizou chefes e sub chefes que se apressaram a espalhar a notícia. Então começou a crescer na repartição um clima de pubescência generalizada. Abandonava-se o relógio em troca de um bigodinho. Rasgavam-se calendários deixando crescer a pêra. Até as senhoras deixaram de depilar as axilas.
Um dia Inácio não veio trabalhar. E toda essa gente se viu entregue à sua orfandade. Olharam para os seus bigodes rídiculos e pêras e axilas e odiaram-se muito. Era um ódio fecundo. E esse fel aprimorava instintos que conduzem inevitavelmente à morte.
O tempo era escasso, a morte urgia e Bonifácio passava alvarás.
Os últimos segundos sairam dos relógios com gravidade. E depois o silêncio.
No dia a seguir a repartição não abriu. Culpou-se o governo e as instituições. Fizeram-se petições, greves de fome, manifestações.
Entretanto numa repartição vizinha Jesualdo comprou um chapéu de feltro por razões desconhecidas, provocando o espanto geral.
Friday, 29 August 2008
A hora dos imberbes
Posted by O Coxo at 00:39 0 comments
Monday, 25 August 2008
La Bâtie
The summer is over. In reality it never came.
Meanwhile, Artamis celebrated its last days giving the illusion of a different Geneva for one night. Now only Usine resists to this kind of "cultural cleansing" initiated last year.
I should have guessed that the city of the bankers and the oil magnats wouldn't tolerate for much longer the alternative cultural mouvement that was living hidden underneath its skin, with its centre in the squats around Plainpalais. It was time to bring things back in track, keeping culture in its usual cages, formated to please the masses.
Rhyno, Artamis, Alhambra, Scala (saved at the last minute, but for how long?), all are symptoms of this intolerance.
True, there are still festivals like "La Bâtie" to make us stay around a bit more. This year Manitoba (Palladium) is even more the centre of the festival with events every night and it promises to help Artamis to say goodbye to this summer in style. Then it also offers a wide range of theatre, dance and music events. Check out yourself in:
Posted by O Coxo at 23:11 0 comments
Friday, 1 August 2008
La petite pause café
ou bien les vacances...
Actually I have been on "blog hollidays" since beginning of July. Things are quite busy at CERN these days (we're getting things set for Doomsday, as some apocalyptical visionaries are saying), so I have been spending more and more time underground, where coffee machines are a rare item.
Plus, it is summer. At least that is what my calendar says although I still need some better proof than a couple of sunny days ending in diluvial rains.
Maybe it is just the fact that I have been living like a mole for the last few weeks and the sunlight starts to feel discomfortable, but I am learning to enjoy this feeling of increasing intimacy with darkness.
Even the rain that just started to fall outside (again) comes as a relief.
Anyway, I will be back during September. I will still be writing as if someone is reading. But that doesn't really matter. My only purpose now is to get through the summer without too much light.
I have a sensitive skin.
Posted by O Coxo at 11:58 0 comments